“Falsidade e dissimulação fazem o caráter geral dos brasileiros – curiosos e inquietos, mas não ativos, nem aplicados.”
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Brasil-Império
A criação do Brasil como um Estado independente, na década de 1820, é obra de uma ação política muito complexa. Isso porque, mesmo no começo do séc. XIX, os habitantes livres da América portuguesa vêem-se, sobretudo, como portugueses, ou identificam-se por meio do elo com as capitanias nas quais estão radicados, definindo-se como paulistas, pernambucanos ou paraenses, por exemplo. Na própria Assembléia Constituinte de 1823, um deputado afirma que, até pouco antes, dizer-se brasileiro não indicava mais do que o lugar de nascimento de um integrante da grande nação portuguesa. Falta, então, um significado político ao “Continente Brasil”, algo que não é de todo alterado com a elevação da América portuguesa à condição de reino unido, em 1815. Nesse sentido, não por acaso os ingleses, durante muito tempo, habituam-se a denominar as possessões portuguesas na América por um plural (algo como "Brasis"), destacando aí a falta de uma identidade comum aos integrantes desse conjunto.
Ao contrário do que se supõe, os homens da época não têm nenhuma certeza sobre quais seriam as conseqüências da ruptura com o governo português, a partir da coroação de um imperador na América. Nada lhes garante que todos os antigos domínios lusos no Novo Mundo se submeteriam ao governo de d. Pedro I, tampouco há uma necessária correspondência, para os contemporâneos, entre o novo Império e a antiga América portuguesa. Exemplo disso é o fato de se sugerir, na imprensa do período, a incorporação ao Império do Brasil de partes dos domínios lusos na África e na Ásia. A construção do Estado independente é pautada pela criação de algo novo, ainda que invocando, sempre que possível, uma herança. A mistura entre ruptura e continuidade é uma marca permanente desse momento. Nesse sentido, o próprio título de imperador dado a d. Pedro I, que tanto estranhamento causa a ministros estrangeiros, é exemplar. Afinal, de onde vem sua legitimidade política? Por um lado, pode-se enxergar nisso um elo com o plano arquitetado muito antes do séc. XIX, no qual se afirmava que os monarcas portugueses, uma vez transferidos para o Novo Mundo, poderiam tomar na América o pomposo título de “Imperador do Ocidente”. Assim, d. Pedro está apenas exercendo o seu direito como o herdeiro dos Braganças que se fixa na América. Por outro lado, é decisivo o papel dos grupos liberais, agrupados na maçonaria, que se empenham na aclamação de d. Pedro como imperador por um motivo bem diverso. Para esses liberais, a ascensão do monarca ao trono por aclamação representaria a vitória da soberania popular sobre o direito divino, argumento que desagrada a políticos como José Bonifácio, preocupados em manter a soberania do monarca. De toda forma, o velho e o novo misturam-se.
A figura e o significado de um imperador na América são criados ao mesmo tempo em que se leva adiante a própria construção da nação. Nesse sentido, não há como negar que a idéia de império também remete à vastidão do território que se pretende manter sob o governo do Rio de Janeiro. Ainda que se tenha reivindicado por diversas vezes os laços criados pela herança colonial, é a inviabilização de outros projetos políticos – que chegam até a propor a manutenção da subordinação de determinadas províncias a Lisboa – que garante a incorporação de um território tão diverso ao novo Estado independente.